sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Desafios da segurança pública requerem gestão integrada


O desenvolvimento e implantação de uma política pública de Estado na área da segurança pública só pode ser efetivada através da integração e diálogo entre todos os poderes e setores sociais. Ações esparsas de segurança pública não são capazes de resolver o problema da violência e da criminalidade que tanto aflige a sociedade brasileira; somente a gestão integrada e a união de esforços podem, de fato, promover a prevenção e o enfrentamento da criminalidade. Esta conclusão sintetiza as explanações de três renomados especialistas na área da segurança pública que, na tarde desta sexta-feira, dia 3, apresentaram suas contribuições ao Comitê Interinstitucional em Segurança Pública (CISP) da Bahia. O ex-secretário nacional de Segurança Pública, Luiz Eduardo Soares; a secretária-executiva do Conselho Nacional de Segurança Pública (Conasp), Regina Miki; e o assessor especial do governador de Pernambuco para a área de Segurança Pública, José Luiz Ratton, participaram do 'I Seminário Interinstitucional de Segurança Pública' promovido pelo Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA) com o objetivo de promover um debater sobre as dificuldades e buscar contribuições para o enfrentamento da criminalidade e da violência no estado. Os nomes dos três especialistas foram indicados pelos membros do CISP para o encontro, e, de acordo com o procurador-geral de Justiça Wellington César Lima e Silva, que presidiu o evento, a escolha foi um acerto feliz porque “foram exposições proveitosas e relatos de experiências que a Bahia saberá aproveitar”.

De acordo com Regina Miki, a carência de índices e informações precisas é um dos problemas da segurança pública no país. “Ainda não temos padronização de nossas ocorrências e dos nossos registros. E política pública só se faz com base em diagnóstico, em um planejamento estratégico que coloque na linha do tempo as ações, a responsabilidade de cada uma delas e que sejam avaliadas periodicamente para corrigir rumos”, explicou. A secretária-executiva do Conasp parabenizou a iniciativa baiana de instituir um comitê como o CISP, que tem um viés não só do diagnóstico, mas também da avaliação.

Construção de uma política de Estado
Em sua exposição, Regina Miki destacou ainda que, no Brasil, por muito tempo imperou o conceito fechado de que somente a polícia fazia a segurança pública, mas hoje, ressaltou ela, esse paradigma foi superado. “Sabemos que existe uma parte da segurança que é prevenção e outra que é repressão qualificada. Essa prevenção passa por projetos e políticas sociais bem estruturadas. Mas nossas dúvidas ainda existem em relação ao financiamento desta segurança e a gestão dos recursos”, observou a palestrante, lamentando que não existe política de Estado na área de segurança no país. Para Regina, isso poderia ser corrigido com a criação do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), cujo projeto de lei está no congresso sem ser aprovado. “Com certeza, a arquitetura do SUSP resolveria esse problema, pois delimitaria as competências, o orçamento e faria com que o país tivesse de uma vez por todas uma política de estado na área da segurança pública”, concluiu.

Salientando, também, que “precisamos construir políticas de Estado que incorporem todos os poderes, os níveis federados, e que promovam, através da transversalidade e integralidade, uma ação efetiva do ponto de vista da política pública”, José Luiz Ratton apresentou aos membros do CISP e demais participantes do seminário as experiências bem sucedidas adotadas no âmbito da segurança pública no estado de Pernambuco. Segundo ele, 26 áreas integradas de segurança foram criadas em todo o estado e as gestões nessas áreas foram sempre realizadas de forma diferenciada, levando-se em consideração as especificidades das regiões. Ratton informou que, com as ações empreendidas, foi registrada uma redução de 600 homicídios entre os anos de 2008 e 2009.

Segundo o sociólogo, o controle e a redução de homicídios é um problema de primeira grandeza. “A redução de desigualdade não é política de controle e redução de homicídios, e programas e projetos de inclusão social não são necessariamente programas de prevenção de violência e do crime”, observou ele, destacando que mesmo programas específicos de prevenção social do crime e da violência têm impacto limitado sobre a prevenção de homicídios. Para Ratton, o controle e a redução de homicídios só podem ser conquistados com uma atuação integrada e focada nas políticas e com a articulação com o Ministério Público e o Judiciário. Além disso, continuou ele, os programas devem ser articulados com o funcionamento permanente da presença policial diferenciada e qualificada.

Milícias são uma ameaça maior
Já Luiz Eduardo Soares, que é doutor em Ciência Política, iniciou sua exposição revelando que há muito tempo não aceita convites para proferir palestras “porque não acredita em palestras” e se cansou de “se ouvir repetir e ver a perplexidade da plateia e da mídia” diante das questões que envolvem “um tema que nos desafia e provoca a todos”. Ele afirmou que aceitou o convite formulado pelo PGJ e pelo presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), promotor de Justiça Geder Gomes, porque o CISP se trata de um grupo de trabalho voltado para a questão da segurança pública, e, em função dessa iniciativa, a Bahia pode ser o próximo estado a desenvolver um trabalho apreciável - tal como está sendo feito em Pernambuco e Minas Gerais - “e, dessa forma, eu quis dar minha modesta contribuição”.

Focando mais sua explanação na situação do Rio de Janeiro, Soares afirmou que é absurdo dizer que o problema do Rio são os traficantes. “A maior ameaça, a maior fonte de selvageria hoje são as milícias, compostas em sua maioria por policiais, que impõem taxas, fazem justiciamento, são articuladas, organizadas economicamente e têm representação política”. O palestrante registrou o trabalho corajoso empreendido por procuradores e promotores de Justiça, desembargadores e juízes para o enfrentamento do problema, acrescentando, no entanto, que o Rio de Janeiro precisa de um governo sério, “que não seja cúmplice das organizações criminosas e que esteja disposto a fazer com que a legalidade constitucional seja respeitada”.

Ele também abordou a questão da tolerância dos governos em relação ao 'segundo emprego' que a grande maioria dos policiais tem, como forma de complementar os baixos salários que percebem do Estado. “Os governos toleram para 'resolver' seu problema orçamentário”, assinalou Luiz Eduardo Soares, explicando que há os policiais que, de fato, atuam em atividades lícitas, mas há os que trabalham para as milícias, para o crime organizado. “Estamos, portanto, diante de um fato presente no Brasil inteiro e do qual não se fala”, advertiu ele, pontuando que as polícias estão sofrendo com essa situação e não há como mudar o quadro sem alterar o patamar salarial da categoria. O palestrante destacou a tarefa importantíssima do Ministério Público do controle externo da atividade policial e de zelar para que a polícia cumpra com seu mandato constitucional. Ele sugeriu que o CISP pense na possibilidade de propor ao Estado da Bahia um plano de ajuste de conduta para que a atividade policial possa ser exercida de acordo com as determinações da Constituição Federal e os policiais não sejam mais expostos a condições subumanas de trabalho.

Além do PGJ e dos palestrantes, compuseram a mesa do evento o procurador-chefe do Ministério Público Federal na Bahia (MPF/BA), Danilo Pinheiro Dias, e o promotor de Justiça Geder Gomes. Criado com a finalidade de contribuir com um Sistema de Justiça Criminal e de Defesa Social mais ágil e efetivo, o CISP é integrado por representantes do MP/BA, MPF/BA, Poderes Judiciário e Legislativo, Polícias Federal, Civil, Militar e Rodoviária Federal, Corpo de Bombeiros, Universidades Federal da Bahia e do Estado da Bahia, Defensoria Pública, Ordem dos Advogados da Bahia/Seção Bahia, Prefeitura Municipal de Salvador e Secretaria da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do Estado da Bahia.

Fonte ASCOM/MP – Telefones: (71) 3103-6505/ 6502/ 6567

Nenhum comentário:

Postar um comentário